Pegadas de Jesus

Pegadas de Jesus

sábado, 24 de setembro de 2016

IRMANADOS PELA DOR


A dor aproxima as pessoas, iguala, nivela, aliás, faz mais do que isso, a dor irmana. Na dor nos sentimos pequenos, frágeis, impotentes. Na dor, nós nos encontramos, somos nós mesmos.

É atordoante a dor do desamparo, É humilhante ser tratado com descaso. Ser apenas mais um número, um anônimo, sem direito a vez e a voz.

E de onde menos se espera, chega um alento, um sopro de esperança. Histórias de dor que são compartilhadas, experiências que são divididas, palavras de consolo, pequenas gentilezas, sorrisos sinceros. Todos irmanados pela mesma dor, pela mesma solidão, pelo mesmo medo do incerto.

Por vezes, um silêncio terrível envolve a todos, ou  uma sagrada expectação.

Passos lentos. Semblantes cansados. Olhares distantes. Impaciência contida.

Todos irmanados pela dor. Não se vislumbra alegria. No rosto de cada um, uma grande interrogação.

O frio cortante, o vento sibilante, a noite escura, dá arrepios naquele lugar. Cada qual procura se abrigar, como dá, mas parece que o tempo pára, não anda, faz complô com aquela noite escura, horrenda.

Aquela é uma página da vida que todos querem esquecer, quiçá, nunca mais escrever.

Mendigos. Mendigos de atenção. Sem nomes. Acompanhantes. Companheiros na dor. E na esperança.

A noite escura se esvai. Deixa marcas. Marcas profundas. Algumas para sempre. Outros esperam.

E mesmo num cenário tão hostil, numa sala de espera de um Setor de emergência de um Hospital Público, naquela noite escura, foi possível perceber  o brilho pálido de algumas estrelas, estrelas de bondade, de carinho, de cuidados, de atenção, que brotaram no meio da dor, de corações irmanados, pela desventura da vida, mas que pulsaram juntos, e juntos provaram o amargo fruto da tragédia humana.

Esta foi minha reflexão, do período de 36 horas aproximadamente, numa sala de espera, na Emergência de um grande Hospítal Público, com todas as suas nuances. De tudo, aprendi o quanto o sofrimento impacta o ser humano. Talvez por isso ele seja uma ferramenta que Deus usa para nos ensinar. Ele sabe tudo. Agora eu sei.


(Socorro Melo).



domingo, 18 de setembro de 2016

ADEUS


Não é fácil. Não é fácil dizer adeus. Não é fácil se despedir para sempre de alguém que fez parte da minha vida. De alguém que vi crescer, que fez parte das minhas brigas e brincadeiras.

Parece que ficou um buraco, como quando se retira uma peça de um quebra-cabeças. Nenhuma outra peça consegue tapar aquele buraco.

Parece que a pessoa se agigantou e de alguma forma se tornou mais presente na minha vida, só que de uma forma dolorida. Há uma inquietude, uma busca desassossegada. Tudo lembra a pessoa. Os lugares por onde pisou se tornam sagrados, as palavras que disse são lembradas com reverência, e nem consigo mais lembrar dos seus defeitos. Daria qualquer coisa para tê-la de volta, mesmo que fosse me contrariando.

Fico imaginando onde estará. Como tem se saído. A lembrança se mistura com a dor da perda. O sofrimento faz reconhecer-lhe a dignidade. E ela se agiganta. Se entranha nos pensamentos. Se olho o céu ou o sol ela está lá. Quase posso ouvir sua voz no rugir do vento...

Arrependo-me de não ter amado mais. De não ter dito tanta coisa. Ou de ter sido intransigente. Das críticas que fiz, da paciência que faltou, do sorriso que não dei...

Os dias se sucedem lentamente. O sol brilha e torna a se esconder. Procuro em vão por uma esperança no crepúsculo. Vejo e não vejo. Queria conhecer o seu mistério.

Pensei que tivesse perdido suas sementes, àquelas que o semeador jogou no sol do seu coração. Mas, não. Com muita surpresa pude vê-las brotar, tímidamente. Até senti vergonha de mim mesma. Talvez eu mesma não tenha produzido frutos tão doces.

Ah, mas é tão difícil saber que nunca mais... Não, nunca mais não, um dia... Naquele dia eterno...

Até lá ficarei imaginando como estará. Ficarei pensando na surpresa que teve em ser tão amado. E imaginando como foi tão bem acolhido. Sentirei saudades.

Eu sei, que conheceu antes de mim uma realidade para a qual eu me preparo, Fez a grande viagem para dentro de si mesmo, ao encontro da Verdade. Mas, não é fácil. Não é fácil dizer adeus. Nada consegue preencher o vazio que a sua partida deixou no quebra cabeça da minha vida. E eu nunca imaginei que pudesse doer tanto. Adeus, meu irmão! Que Deus te aconchegue no seu grande amor e inefável coração.

Socorro Melo

Em homenagem e memória do meu irmão José Célio de Melo
* 01/06/1971
+ 10/09/2016