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O medo tornara-se pavor, e a angústia era tanta, que o sufocava ainda mais que
o saco que o envolvia. E foi neste momento, que se sentiu arrastado para fora.
As dores musculares eram tão fortes, que mal conseguia ficar de pé, em
compensação, sentiu o ar fresco entrar em seus pulmões, conferindo-lhe certo
conforto. Do que valia isso? Se em poucos instantes iria estar morto mesmo.
O saco foi retirado de sobre seu corpo, com a mesma rispidez com que fora
colocado. Ainda com a venda nos olhos, sem saber se era dia ou noite, pensava - então é isso, chegou minha hora.
A venda dos olhos foi arrancada, para completar aquele quadro de horror,
e Alfredo se viu diante dos bandidos, que abdicaram de seus capuzes, e
máscaras, e o olhavam indiferentemente, como se ele não passasse de um verme
nojento e sem importância.
Estavam no meio de um matagal, e já era noite. Não havia nenhum barulho,
a não ser o dos grilos. Alfredo tentou ouvir algum som, ou ruído, vindo da
rodovia, porém, o silêncio era aterrorizante.
Um deles, o gordo e careca, mandou que ficasse de joelhos, e encostou-lhe
o revólver na nuca. Os outros dois, que pareciam até mais debochados, se
posicionaram logo atrás, e ficaram em grande expectativa.
Os segundos pareciam horas, e Alfredo já ansiava pelo disparo, pois, não
agüentava mais tanta agonia. Com um sotaque carregado e utilizando-se de gírias, iniciou-se uma conversação entre eles:
- Atira logo, Gordo, que demora é essa? Ou tá querendo poupar o mané?
Falou aquele que tinha tatuagens por todo corpo, e que era chamado de Tatu.
O terceiro, um afro-descendente, magricela e feio, interveio:
- Aê, Gordo, acaba logo com isso, mermão.
Alfredo, que já se convencera do seu fim, sentiu um calor subindo pelo
corpo, e tomado por uma coragem insana, falou, mais para si do que para eles:
- Por favor, não me matem, eu nunca fiz mal a vocês, tenho família, me
deixem viver, em nome de Jesus, e de Nossa Senhora de Aparecida...
E naquele
momento, um vento forte e uivante, se fez ouvir no matagal.
- Cale a boca!- gritou Tatu. Tu vai morrer mané, teus santo não tão nem
aí pra tu - e sorriu escandalosamente, sendo seguido pelo magricela, que disse:
- Bora Gordo, tá com medo de que? – e os risos
continuaram.
E neste momento, o Gordo retirou a arma da nuca de Alfredo, virou-se para
os dois que estavam por trás dele, e disse ferozmente:
- Calem-se! Já estou cheio dessas intromissões. Não se esqueçam de que
sou eu quem manda aqui. Não tenho medo de nada não, mas, não gosto de encrenca
pro lado de santo nenhum. Vamos embora, deixa o mané aí. Tirem toda roupa dele,
deixem-no só de cueca.
Os outros, que não disseram uma palavra sequer, recolheram a roupa de
Alfredo, e o empurraram num barranco, e depois seguiram o Gordo, que se
dirigia para o caminhão.
Passados alguns minutos, Alfredo se levantou, e desatou a chorar como
criança desmamada. Com o corpo trêmulo e coberto de terra, o rosto machucado,
sentou no barranco, tirou a medalhinha de Nossa Senhora de Aparecida, fez uma
prece silenciosa de agradecimento, beijou-a, e se pôs de pé.